"Nem eu nem ninguém pode viajar essa estrada por você. Você deve atravessá-la sozinho"

Walt Whitman

quinta-feira, 14 de julho de 2011

O sol também se levanta

Algumas literaturas retornam a nossa memória ao percorrer o Caminho de Santiago de Compostela, mesmo que elas não estejam diretamente envolvidas com o lendário caminho. Entre elas duas fizeram-me vivenciar as paisagens espanholas descritas naquelas obras.

A primeira obra literária foi o romance “O sol também se levanta” de Ernest Hemingway. Assim que desembarquei em Madri fiz uma conexão para a cidade de Pamplona e ali, as imagens do romance apareceram ao avistar a praça e seus cafés, principalmente o Café Iruña, tão falado no romance, bem como a imensa escultura retratando o “Encierro”, a famosa corrida dos touros na Festa de San Firmin, também contada e vivenciada pelos personagens do romance.

A outra literatura foi o “Dom Quixote” de Miguel de Cervantes, ao ultrapassar o Monte do Perdão e encontrar os modernos moinhos de ventos, e dos sons das imensas paletas cortando o ar, lembrei dos monstros do "homem de la mancha".

O sol também se levanta.

“Considerado pela crítica norte-americana como o primeiro grande romance de Ernest Hemingway (mesmo ele tendo publicado, um ano antes, a novela The Torrents of Spring), O Sol também se levanta, de 1926, é um retrato fiel daquilo que ficou conhecido como Geração Perdida (Lost Generation). O termo foi popularizado pelo próprio Hemingway, que buscava caracterizar uma parcela da população americana que se mostrava descrente quanto ao seu futuro logo após a Primeira Guerra Mundial.” Bernardo Biagioni

Para ler e conhecer mais:

http://viagemerrada.blogspot.com/2009/03/o-sol-tambem-se-levanta-hemingway.html

http://www.cafeiruna.com/


Prefeitura de Pamplona

Escultura simbolizando o "Encierro" as famosas corridas dos touros na Festa de San Firmín

Fachada do Café Iruña, imortalizado através do romance de Ernest Hemingway

Trechos do romance “ O sol também se levanta”

[...] Os dois dias seguintes em Pamplona foram calmos. A cidade aprontava-se para as festas. Trabalhadores montavam as vedações que fechariam as ruas transversais, quando os touros fossem largados dos currais e viessem a galope pelas ruas, de manhã, a caminho da arena. Os trabalhadores abriam buracos e metiam estacas, cada uma com o número correspondente ao seu lugar. No planalto, fora da cidade, empregados da praça exercitavam cavalos de picador, fazendo-os galopar curto nos terrenos duros e requeimados do sol, por trás da praça. A grande porta da praça estava aberta, e lá dentro varriam o anfiteatro. A arena estava sendo alisada e borrifada, e carpinteiros substituíam pranchas frouxas ou partidas da barreira. Da beira da areia, finalmente alisada, viam-se os lugares vazios e velhotas varrendo os camarotes.

Cá fora, a vedação que ia da última rua da cidade até à entrada da praça estava já colocada e formava uma extensa fiada, a multidão havia de vir a correr no encalço dos touros, na manhã do dia da primeira tourada.

p/97


II - O sol também se levanta

Trechos do romance "O sol também se levanta" de Ernest Hemingway

[...] Ao meio-dia de domingo 6 de Julho, a fiesta explodiu. Não há outra maneira de descrever. Gente chegara continuamente de fora, mas a cidade assimilara-a e não se dava por ela.

Agora, no primeiro dia das festas de San Fermino, desde manhã cedo que tinham estado nas tabernas das ruelas da cidade. Ao passar pelas ruas, a caminho da missa na catedral, eu ouvia-lhes as cantorias que vinham das portas das lojas. Estavam a aquecer.

Havia muita gente na missa das onze horas.

San Fermín é também um festival religioso.

p/98




Gente chegava de todos os lados à praça, e no fundo da rua ouvimos as gaitas-de-foles e os tambores que chegavam. Vinham a tocar o riau-ríau, as gaitas estridentes e os tambores reboando, e atrás vinham os homens e os rapazes a dançar. Quando os gaiteiros pararam, sentaram-se todos na rua, e quando as gaitas e os pífaros chiaram e os tambores cavos, tesos, duros, ecoaram de novo, pularam para o ar a dançar. Na multidão, só se distinguiam, subindo e descendo, as cabeças e as mãos dos bailadores.

p/99


As festas haviam começado de fato. Duravam dia e noite, por sete dias. A dança durava, o beber durava, o barulho continuava. As coisas que aconteceram só podiam ter acontecido durante uma fiesta. Tudo se tornou inteiramente irreal, e parecia que nada podia ter consequências. Até parecia deslocado pensar em consequências, durante a fiesta.

Durante a fiesta tinha-se a sensação, mesmo quando havia sossego, de que era preciso berrar para ser ouvido. Acerca de qualquer ato, a sensação era a mesma. Era uma fiesta e durava sete dias.

p/99




- Quero um cantil de couro - declarou Bill.

- Há uma loja mais adiante - respondi. - Vou comprar dois.

Os bailadores não queriam que eu saísse. Três deles, sentados no tonel ao lado de Brett, ensinavam-na a beber pelas borrachas.

p/100

Não vi Brett nem BilI, e alguém me disse que estavam na sala do fundo. Ao balcão, a rapariga encheu-me os dois cantis. Um levava dois litros e o outro cinco litros. Encher os dois custava três pesetas e sessenta cêntimos. Alguém ao balcão, que eu antes não vira, tentou pagar o vinho, mas acabei eu por pagá-lo. O homem que tinha querido pagar ofereceu-me então um copo. Não aceitava que eu retribuísse, mas disse que beberia uma golada do novo cantil. Levantou o de cinco litros, e apertou-o, de modo que o vinho chiou-lhe no fundo da goela.

- Pronto - e restituiu-me a borracha.

Desenrosquei a tampa da borracha grande e ofereci-a em volta. Todos beberam, levantando-a a todo o cumprimento do braço.

Acima da cantoria, ouvia-se a música, lá fora, da procissão que passava.

- Isto não é a procissão? - perguntou Mike.

- Nada - respondeu um deles. - Não é nada. Beba. Vire a garrafa.

p/101




III - O sol também se levanta

Trechos do romance "O sol também se levanta" de Ernest Hemingway

[...] Os balcões estavam todos apinhados de gente. De súbito, uma multidão entrou na rua. Vinham todos a correr apertados uns contra os outros. Passaram e subiram a rua em direção à praça de touros, e atrás deles vinham mais homens a correr mais depressa, e depois alguns farroupilhas que corriam de verdade. Atrás deles havia um pequeno espaço vago, e logo os touros, a galope, com as cabeças abaixo e acima. Tudo se sumiu ao virar da esquina.




Um homem caiu, rebolou para a valeta e deixou-se estar quieto. Mas os outros touros foram a direito e não deram por ele.







Corriam todos juntos

Depois de se terem sumido, um grande clamor veio da praça. E manteve-se.

Depois, enfim, o estoiro do morteiro que significava terem os touros atravessado a massa de gente na arena e entrado para o touril.

p/103

IV - O sol também se levanta

Trechos do romance: O sol também se levanta de Ernest Hemingway

[...] - Viste o espetáculo? - perguntei.

- Vi. Estiveram lá todos.

- Foi alguém ferido?

- Um dos touros apanhou a multidão dentro da arena e atirou com seis ou oito pessoas ao ar.

p/103




O toureio de Romero produzia emoção autêntica, porque ele conservava uma absoluta pureza de linhas nos seus movimentos e sempre sossegada e calmamente deixava que os cornos passassem por ele rentes.

p/108

domingo, 10 de julho de 2011

Missão

Caminho em Tricastella e Samos

Missão
Dom Helder Câmara

Missão é partir,
caminhar,
deixar tudo,
sair de si, quebrar a crosta do egoísmo
que nos fecha no nosso Eu.

É parar de dar volta
ao redor de nós mesmos
como se fôssemos o centro
do mundo e da vida.

É não se deixar bloquear nos problemas
do pequeno mundo a que pertencemos:
a humanidade é maior.

Missão é partir,
mas não devorar quilômetros.

É, sobretudo, abrir-se aos outros como irmãos,
descobri-los e encontrá-los.

E, se para encontrá-los e amá-los
é preciso atravessar os mares
e voar lá nos céus,
então Missão é partir até os confins do mundo.

Postado por Luciene Pires no Facebook.