"Nem eu nem ninguém pode viajar essa estrada por você. Você deve atravessá-la sozinho"

Walt Whitman

quinta-feira, 8 de julho de 2010

A arte de ser feliz

Foto: Emanoel Braga - El Acebo (Caminho de Santiago)
Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia feita de giz..
Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto.
Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde, e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.
E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros, e meu coração ficava feliz.
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor.
Outras vezes encontro nuvens espessas.
Avisto crianças que vão para a escola.
Pardais que pulam pelo muro.
Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais.
Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar.
Morimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega.
Às vezes, um galo canta.
Às vezes, um avião passa.
Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.
E eu me sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

MEIRELES, Cecília. Escolha o seu sonho. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 1968. p.25

Um comentário:

  1. Olá amigo Emanoel, que coisa linda este escrito !!
    Conheço-o, já ouvi num sarau, entre amigos, e ainda o analisamos !
    Uma beleza !

    Parabéns pelo blog.

    Jurema

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